segunda-feira, 20 de junho de 2011

Pessoas! Pessoas... Vidas cruzam-se num relâmpago. Ninguem se interessa por ninguem. Ninguem olha para ninguem. Porque as pessoas não confiam em ninguem. Todos mentem. Tu mentes. Eu minto. Eles mentem. Everybody lies.

"Tão cedo sinto os teus lábios a tocar os meus, mesmo que meus pensamentos divaguem. A tua voz esta distante e tremida como sempre. Sinto-te tão perto de mim, que o meu sangue estagna. Pára! Conheci-te e agora conheço-te. Respiramos o mesmo ar e contamos as mesmas mentiras. As mesmas histórias horrendas. Insuportável tornou-se o nosso caminho rotineiro. Estou farta de pisar a relva escura e de a cortar! Os teus guisados não sabem a comida. Nunca souberam. Nunca me importei, mas agora importo me menos ainda. Tu não gostas da minha mão e puxas as calças para cima. Estas perto de mim. O meu sangue morre. Os corpos rompem se, à medida que o teu sangue fervilha nas tuas mentiras. Esgota-se o tempo dos amores. Cruzo-me com milhares de pessoas e observo meticulosamente o calçado de cada pessoa. Parece que vou de cabeça baixa. Vou a observar o calçado. Sempre me contam histórias. Os teus sapatos em bico são pretos e baços. Sem brilho nem oportunidade para falarem a verdade que envolvem secretamente. São silenciosos e não me contam histórias novas. Toda a gente usa calçado. Famílias com miúdos calçados, contam mais histórias ainda. Os pais escolheram o dobro do calçado. Existem mulheres que escolhem o triplo. Para elas, para eles, ou para elas, e para os miúdos deles e delas. E depois o calçado conta me histórias. Divago por entre as pessoas adultas vestidas de negro como as suas almas ao penduro. Porque cumprem tarefas escuras e sucumbindo lentamente disfarçam-se de almas negras apáticas. Olho os rostos e lembro-me de pessoas que eu conheci. Imagino-os com dezoito anos, como os conheci. Prefiro mante-los assim. Com os rostos joviais e repletos de sonhos, e não estas nuvens negras moribundas ziguezaguiando por aí. Perdidas do seu rumo. São todos iguais.
Troco de voo. Sento-me no meu correcto lugar. Uma miúda de dezoito anos espanhola senta-se a meu lado. Só percebo quando diz puta e conho. O resto é um emaranho de palavras e atitudes infantis. Tem um piercing no nariz e uma tatuagem na face, encostada à orelha. Troco de voo. Senta-se um velho do meu lado direito e outro do meu lado esquerdo. Ambos de fato cinza escuro. Falam para mim toda a viagem. Digo que sim com os meus acenos irritantes de cabeça. Mas não os irrito. Gostam de mim.
As arvores passam muito rápido, e as cercas. Deixei finalmente de ver nuvens cinzentas e o céu mantem-se azul. La esta a relva escura velha cansada. Velha e descomposta. A nossa cerca esta com a côr desbotada e abandonada. A casa de madeira. Atravesso o jardim a pé. O carro fica encostado ao passeio no meio da estrada. Era impossivel atravessar o pátio sem matar algum dos teus gatos. Tenho de deixar o carro no meio da estrada. Encostado ao passeio. Entro e lá estás tu. A olhar para mim com aquela cara tão apatica. Gritas, seguras-me pelos ombros e gritas. Detesto ruído. Fecho os olhos irrito-te ainda mais. Abanas-me pelos ombros e gritas. Olho para ti como nunca olhei antes, com desdem. Sem nada para te dar. Inventas histórias da mentira e olho para o teu calçado. Umas sapatilhas coloridas estão perto das cortinas que tocam o chão. Estas descalça, sem meias nem ideias nem  comportamentos. Abanas-me pelos ombros e o meu sangue finalmente fervilha, fecho os olhos. Quero gritar mas sinto-me cobarde. E lembro as pessoas que são todas negras e iguais, vazias de proveito e alegria, cheias de trabalho consumista e de horas desperdiçadas. Olho os teus olhos verdes e lembro-me de tudo... Fecho os olhos e sei porque não me quero lembrar de mais nada. Só conheces a mentira e as histórias que inventas dela. Pouso a minha mala e olho para o frigorifico enquanto permaneces na sala, soltando umas palavras agudas. Tens uma voz aguda insuportavel. Andas aos circulos em volta do sofa e levantas as mãos. Olho o frigorifico, abro lentamente a porta com aqueles movimentos mecânicos, pois a fome não me chega desde que morreste. Estas ali na sala, morta aos gritos.
Gosto das pessoas e de tudo o que é normal. Coisas comuns enchem o nosso lar e gosto. Pego numa taça de fruta que ocupa a mesa dos almoços ingratos. Atiro-a contra a janela... E tudo se parte... Os morangos e laranjas ficam espalhados no pátio. O som dos vidros a partirem-se com violência acalmam o meu batimento cardiaco. Foram dois segundos que não ouvi gritos. Seguiu-se o silêncio. Abri o frigorifico e retirei um iogurte. Estava bom, e dentro da validade. Sentaste-te mesmo à minha frente. Na mesa dos jantares. Ficamos ali, admirando a janela perplexas. Nesse dia pintas-te até bem de madrugada "a Janela." 
Eu esqueci os gritos. Porque somos todos iguais e banais. Gostei muito do quadro da Janela."

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Deixa-me ir e larga-me a mão. Porque as coisas não nasceram para ser todas iguais. Porque os sons e as imagens misturam-se com a realidade. E o meu descernimento perdeu-se pelo meio das tuas mentiras e jogadas. Prefiro a tua simplicidade natural do que a tua apatia hipócrita.
Quando saímos naquela tarde nocturna já a Lua tinha desenhado o seu lugar no céu. As horas pareciam não fazer sentido, mas eu via beleza em todo o lado. A beleza do comum. Não estarei sozinha nunca mais, mesmo que não consigas ver a pureza do meu sistema. Inventei uma história  para nunca mais me fugires. Não ouvi tua voz toda a tarde. Sentia as tuas mãos e o teu medo.
Quando saímos naquela noite nunca imaginei que fosse a ultima.
(...)
Sentia a erva humida por debaixo dos meus pés descalços. Tu corrias à frente sem que eu te conseguisse alcançar. O teu cabelo brilhava ao sabor das cores outunais e não mais eu pensava em recessão e na estupida da crise. Conseguia ouvir a bicharada a cantar a tua musica. Tu dizias me que um dia haverias de compor um album com sons naturais. Gravado debaixo de um platano. Por entre a chuva. Sentia agora a lama a entranhar-se nos meus dedos. Liberdade de espirito. Nao sentia a minha alma, nem o teu medo. A medida que a musica fugia da minha cabeça, tu ficavas ainda mais longe, rodopiavas e sorrias para mim. O teu vestido rodava e estava todo sujo... O teu sorriso era confuso e acanhado. Colocavas a mão a frente da boca e olhavas para o céu... Olhei tambem o céu!
Desapareceras. Não te vi mais. Mas ouvia o teu riso. Mas vinha de todos os lados. Acelerei o passo... Ja nao mais te encontrava e o som da tua voz vinha de todas as arvores. Todas as gotas alojadas nas folhas amareladas. Ajoelhei-me chão. Senti as minhas rotulas serem engolidas por uma camada leve de lama. Sentia o frio da lama. Nada era real. Nem o Outono nem o teu sorriso. Nem o teu vestino nem a côr do teu cabelo dourado. Mas a tua imagem era real... Só não sei de onde vieste nem para onde foste.... 

terça-feira, 7 de junho de 2011

Não sei bem ao certo.... Traição!!!!!

Bem, eu sei que usar males para atingir fins está completamente errado. Contudo apercebo-me que ás vezes se formos guiados pelo bom censo e pelos princípios puros e ingénuos, se o resultado for errado, torna-se contudo o caminho certo. Melhor fazer as coisas certas mesmo com repercussões negativas, do que fazer as coisas erradas para atingir resultados positivos.

(…)

            “Sei que a tua amizade está impossibilitada para mim tal como o teu amor. Mas mesmo assim, adoro ver-te a caminhar descontraída, quando te vejo a sorrir ingenuamente, o meu dia fica completo.


(…)

            Saio de casa ligeiro, e ainda não sei que horas são, só sei que são horas de eu ir. Tomo um café para que os meus olhos se mexam com mais facilidade e sentir aquele gosto delicioso durante uns minutos na boca. Chego ao trabalho atrasado como sempre e espreito para o escritório, e reparo num amontoado de papeis, pastas, copos de café, o computador ainda ligado, e vários papeis soltos e espalhados por cima de uma secretária com uma pequena chapa de metal que indicava o nome “Henrique Borges”. É terrível ver assim uma desorganização á segunda-feira de manhã, mas como a secretária é a minha acho que já ninguém dá importância a minha inata desarrumação.

            Sento-me e olho para o computador, enquanto penso e recapitulo o meu fim-de-semana. Foi óptimo, festas, copos, amigos, tempo sempre preenchido. Mas quando chegava a casa com a camisa ensopada em água, e me deparava com o silêncio próprio do meu lar, sentia um vazio. Nunca ninguém tivera antes o dom de preencher este meu vazio, mas tu tiveste. Parece que às vezes sinto a tua presença a pairar no ar, o teu cheiro no quarto, as tuas mãos na cozinha, o teu carinho na sala. Pensei por momentos que tu eras aquela, a única mulher com quem era capaz de partilhar o mais ínfimo segredo, terrível ou bom, eu sabia que tu estavas ali para mim. Tínhamos programas excelentes, nunca estávamos quietos em casa, no trabalho, nas saídas, em nada. Éramos eléctricos, e nos amávamos! Mas como ridículo homem que sou, as minhas fraquezas surgiram por varias vezes, talvez tal como as tuas, e tiraram-me o alento da minha vida, o perfume da minha alma… tu! Quando me dizias entre dentes, “… que a dor do ciúme é igual tanto para o homem e como para a mulher, se o amor for de facto verdadeiro!”, eu não acreditava. Eu dizia, que “…os homens, como galantes natos que são, por vezes as traições acontecem, mas eles já não se lembram na hora seguinte quem era a infeliz da cobaia nem de onde vinha… mas as mulheres são diferentes, a traição proveniente delas, dói muito mais”. E tu, ponderando o que eu dizia, insistias para que eu percebesse “… mas a dor, que o ciúme provoca lá dentro, é igual de mulher para homem se o amor existir mesmo ”. De facto, discordávamos em muitas coisas, tu eras uma típica feminista, e eu, um típico machista! Fantásticos que éramos, foram estas diferenças que nos aproximaram, e que igualmente nos afastaram. De facto, na minha ideologia, nunca pensei, que se poderia despedaçar de tal maneira um coração, em que ele jamais tivesse possibilidades de retomar ao que era anteriormente.

            Caio em mim, e retomo á passividade do meu escritório, ergo lentamente a cabeça e vislumbro o meu chefe, especado a olhar para mim com cara de sério e preocupado. Sempre fora uns dos seus melhores agentes de campanhas publicitárias. Fazia as melhores campanhas de marketing e tinha ideias geniais para toda a publicidade em geral. Contudo, tenho vindo a tornar-me um desleixado e despreocupado. E sei que as pessoas notam, mas já não me importo mais, vou esperando que passe e sei que os meus colegas também esperam tal como eu, mas por vezes, talvez me tenha excedido em várias situações, e o enfadonho do meu patrão deve ter-se apercebido. Mas eu nunca imaginei que tu me fizesses tanta falta, nunca imaginei que pudesse ficar assim um dia.

            Aconselhou-me a pegar nas minhas coisas e tirar umas ferias, para quando voltasse não haver mais desculpas e deslizes. Sei que ele sempre adorou o meu trabalho e estava a dar uma última hipótese ao retorno da minha inspiração.

            Aceitei com agrado, peguei nas minhas coisas e conduzi em direcção a casa, e a ti. Mas o único que me esperava incansavelmente em frente á porta e abanando a cauda era o pobre Scott.”

(…)

            “Não acredito que me atrasei outra vez! Entro a correr sem olhar para as caras de desagrado dos meus colegas e peço mil desculpas entre dentes. Enquanto visto a minha bata branca ouço os latinos incessantes dos cães enquanto que os gatos se empolgam todos e fazem gemidos de leões. Não percebo às vezes este meu emprego. A bicharada há-de de ficar sempre doente de manhã. Engulo o café que me colocaram na secretária e queimo a garganta de uma ponta á outra.

            Adoro o meu trabalho e sei que o faço dentro do que se chama “satisfatório”. Mas todos os dias entro aqui, e olho para os meus clientes ansiosos e tenho sempre medo, de no meio de todos surgir um lindo labrador castanho de nome Scott que me fará uma festa interminável.

              Não quero de modo nenhum voltar a ver o meu pequeno Scott, que já fora meu em tempos, a entrar aqui desajeitadamente e desejoso por me ver. Não sei se me arrependo ou não de nunca o exigir, mas não sou assim uma rocha tão fria, e deixei parte do meu amor com ele naquele bichinho baboso. Tento afastar todos estes meus pensamentos auto destrutivos e tento trabalhar concentrada.

            O dia foi completo e passou num instante, não vou a casa dos meus pais hoje! Desde que fui morar sozinha, ficaram duas vezes mais velhos e três vezes mais chatos. Sei que as coisas não me correram bem, mas isto é a triste sina de uma mulher que amou e confiou. Agora tenho de me desenrascar sozinha e encarar a vida como sempre encarei, com alento e determinação. Entro no meu pequeno mas acolhedor apartamento. Faço a minha rotina habitual e descanso um pouco em frente á minha janela acompanhada de um chá, vendo as gotas de chuva suavemente a escorregarem pela vidraça abaixo. É impossível não me recordar de ti, das tuas gargalhadas puras e impiedosas, que me faziam rir mesmo quando não havia piada. Das conversas vazias de assunto que tínhamos, mas cheias de loucura e paixão. Adorava quando entravas em casa tu, e o Scott com lama até aos pés e iam a correr para a casa de banho e chafurdavam aquilo tudo. Arrumava sempre para ti, cuidava de ti, cozinha para ti sempre com muito carinho e tu sabias disso. Vias que fazia as minhas tarefas com dedicação e prazer, e idolatravas-me por isso. Eu fazia-as para ti. Agora, pouso a chávena em cima do televisor, e deito-me no emaranho de cobertores que tenho no sofá e não pretendo sair de casa por coisa alguma neste mundo. Não tenho qualquer tipo de vontade de cozinhar, ou de fazer seja o que for. Tenho pena de mim mesma quando me lembro de ti, apesar de tudo, ainda penso em ti e sinto o teu cheiro envolvendo-me nos teus braços! Quando te deitavas a meu lado e adormecias completamente descontraído e satisfeito eu observava a tua plenitude. Olhava para ti, e fotografava aquele momento no meu inconsciente, e logo depois adormecia eu, livre e preenchida!

            Sei que me mostrei forte e determinada, fria e decida, mas as coisas que tu não sabes…! Sabias que ainda guardo as rosas, mas agora secas e bem tratadas, que me ofereceste naquele dia no meio do nada?! Quando entraste de rompante pela porta adentro e disseste que eram para mim, eu questionei-me, e disse-te que aquele dia não era nenhuma data em especial. E tu com aquele sorriso sedutor, abraças-te me, olhas-te nos meus olhos e deste-me um beijo meigo e cheio de paixão, e disseste que é nestes dias que me amavas mais, que eram praticamente todos! Os dias sem nada, sem coisa alguma, sem data nenhuma, sem desculpa aparente, mas passados comigo, eram os dias cheios de tudo! As coisas que me dizias… Sabias que ainda durmo com uma camisa tua que sei que nunca tiveste coragem para a vir buscar nem eu de a ir entregar?! Talvez gostasses que eu guardasse algo teu, não sei. Mas lembro-me nos sábados de manhã, quando a minha cara estava sempre no auge do terrorífico e o meu cérebro funcionava a dez quilómetros por hora, em que só tinha capacidade para vestir aquela camisa tua, tu adoravas e rias-te como uma criança, dizias que tinha um ar de vilão derrotado. Eras um malandro cheio de graça. Nos dias que correm, contento-me a olhar pela minha janela e ver a vida a andar lá fora e a minha sempre no mesmo charco. Foste único para mim, amei-te e fui tua, naquele tempo em que passamos juntos.

            Agora olho com negrura e saudade para nós e para o que fomos em tempos e a nossa vidinha louca, que eu tanto idolatrava, sei que a Laura que existiu em tempos sucumbiu juntamente com aqueles dias. E adormeço lentamente com a força do cansaço e desmotivação, imaginando como estás, agora.”


(…)


            Henrique talvez tentara de tudo para esquecer Laura, quando viu a grandiosidade do erro que causou no coração de Laura e sentiu pela primeira vez o sabor da frieza e determinação que era tão própria da sua companheira. Ele conhecia-a como ninguém, e sabia que ela nunca o iria perdoar e sabia que nunca ela voltaria a fazer o seu sorriso sincero para ele. As suas mãos não mais encaixariam nas suas, nem o seu rosto pousaria mais sobre o seu! Ele desejou muitas vezes ter recuado no tempo e ouvir com atenção as palavras de Laura, as palavras que sorrateiramente saíam da sua boca e que parecendo sem significado algum, eram afinal a chave do seu coração. Fora parvo e cometeu um erro, que aos olhos de Laura era e é imperdoável. Mas a determinação dela, assombrou-o, ele sabia que Laura no seu íntimo talvez tenha sofrido, mas não tanto quanto ele. Pois Henrique ainda sofre, e ainda a deseja. Ela fora mais forte e fria, a facilidade com que ela fez as malas e foi viver sozinha deixou Henrique abismado com a força que mais uma vez a sua companheira demonstrava. Sabia que Laura saíra de casa convicta que ele errara com ela no que ele era mais fraco, e no que ela era mais forte. E Henrique sabia disso, e talvez por isso é que sente que Laura já não mais sente a falta dele, nem muito menos a vontade de o ver só mais uma vez. Talvez a tenha desiludido de tal forma que tornou a ida mais fácil para ela.

            O tempo descortinou as personalidades, destes dois que em tempos foram loucos amantes, e desenhou o triste destino.


            Estávamos numa quente noite de Verão, Henrique combinou encontrar-se com Laura num barzito perto da praia, ela chegaria atrasada do trabalho nesse dia, e eles acharam melhor encontrarem-se depois. Enquanto Henrique esperava impacientemente por Laura na companhia agradável dos seus amigos, ia bebendo uns copos e animando a festa. Teresa tinha ido nesse dia, acompanhada de uma outra amiga, a jovem Luísa! A amiga de sempre de Laura não perdia uma, sempre á espreita de conhecimentos novos no campo masculino, Teresa era bonita e aprumada, por isso tinha sempre pontos a seu favor no que interessava na matéria de homens. Os seus olhos pretos rasgados deixavam no ar o seu lado misterioso, e as suas pernas bem feitas eram um convite a qualquer um para uma saída mais extravagante. Era uma sedutora infalível e os assuntos acabariam por cair na mesa, e Henrique escutava as conquistas e situações extravagantes de Teresa com espanto e agrado. Tiago, com uma aparência de surfista e um humor desigual conversava animadamente com Diogo e com Luísa.

            Luísa, era entre as três amigas a mais reservada, não falava muito sobre si nem muito menos sobre os outros, causava sempre uma onda de intriga no ar, visto que as suas conversas nunca passavam do banal. Mas Henrique naquele dia decidiu tirar aquilo a limpo. Afinal de contas, Luísa ía inúmeras vezes lá a casa, era amicíssima de Laura e Teresa, e não conhecia ainda bem aquela miúda, e estava na hora de tentar perceber aquele cérebro feminino de uma vez por todas.

            Henrique e Luísa já bebiam copo atrás de copo, e Luísa começou a fraquejar, falava que seu irmão morrera na tropa, seu único e maravilhoso irmão como ela mesma dizia, e que a sua vida de filha única tornara-se um caos, e que desde então Laura tinha sido um apoio sublime na sua vida. Os casos com os homens que tivera não duravam mais do que um mês, tornavam-se todos possessivos, curiosos e demasiado Homens, machistas! Henrique conseguia ler pelo brilho dos seus olhos, naquela jovem mulher de 22 anos, que tivera uma vida sofrida, sem carinho nem amor, que nunca tivera um companheiro que a respeita-se nem muito menos a amasse tal como ela amava Laura. A sua família sempre a trataria como a pequena menina dos papás, de infância imortal e de presença constante, pobre miúda, seus pais ainda não haviam percebido que ela crescera!

            Contudo, Henrique percebera agora com mais certezas, o porquê do apoio constante que Laura sempre disponibilizara para Luísa. Ele sabia que a sua companheira sempre tivera aquele lado acolhedor fosse para quem fosse.

            O álcool começou a subir-lhes a cabeça mais rápido do que calculavam, e Luísa não se sentindo bem, pediu a Henrique que a acompanhasse lá fora! Ambos avisaram os amigos, e logo se aprontaram a sentar na areia ao som da rebentação das ondas, em frente ao Bar, ainda nauseados com o cheiro de álcool. Com a brisa salgada a bater nos rostos a boa disposição retomava, e fui aí que aconteceu. Que o lado fraco de Henrique prevalecera como sempre Laura tivera medo que acontecesse. Luísa começava a insinuar-se a Henrique, e confessou-lhe que o amava desde a primeira vez que se conheceram, mas que nunca dissera nem demonstrara nada antes, com medo de perder Henrique e Laura.

            Mas uma mulher perdida emocionalmente, e agora psiquicamente devido ao excesso de álcool, porque não comer o companheiro da sua melhor amiga?! Porque não haveria ela de saciar a sua fome com o homem que mais adora no mundo agora que tem uma digna e única oportunidade?! Porque não haveria ela de trair a confiança de todos os seus amigos e amigas ali naquele momento?! Porque não fazer amor com ele ali mesmo, e passar por cima da sua própria dignidade e valores?!

            Claro que uma mulher quando chega a pontos extremos é capaz de tudo, aproveitando-se do estado lastimoso de Henrique, a traição consumou-se. Ela foi-se aproximando dele e sem que Henrique discernisse bem naquele momento o que era certo ou errado, quando já ela o tentava beijar já ele estava com as mãos nas calças.

            Laura chegara, e pediu imensas desculpas pelo enorme atraso, mas teve que levar o Scott á rua e ele hoje parecia não querer voltar, estava irrequieto e farejava tudo! Cumprimentou tudo e todos amavelmente, e perguntou por Henrique. Teresa aprontou-se a dizer á amiga que Henrique levou Luísa a apanhar ar na praia, visto que a miúda estava encharcada de álcool, e com certeza eles voltariam rápido. Laura sentou-se á beira dos amigos e seguiram-se as conversas disparatadas. Mas Laura não estava bem, não conseguia ouvir com nitidez as conversas dos amigos, a sua mente estava longe, estranhou aquele comportamento de Henrique, e mais estranhava a demora. De repente, levantou-se e disse a Teresa que ia à casa de banho e voltava num instante. Contudo, a sua vontade estava bem longe daquele cubículo que fica nas traseiras do Bar, estava sim focada no areal e nas pequenas escadas de madeira que começava a descer em direcção á praia. Procurava Henrique e não o achava, era tudo tão estranho, em qualquer altura, ele estaria á sua espera impaciente pela demora. Mas desta vez não, estava a passear com a Luísa, e ainda para mais alcoolizada. Mas que peripécia! Foi então que viu dois vultos… Perto do mar, com a rebentação das ondas a sussurrar-lhes ao ouvido o pecado, a abafar o som dos movimentos! O luar sobre o ondular do calmo mar a iluminar a negrura da praia, a iluminar a podridão!


- A Laura, Teresa!? Ainda não chegou?! Onde está!? – Henrique estava ofegante e assustado. Chegou muito antes que Luísa e parecia impaciente.

- Calma Henrique, ela á pouco disse que ia à casa de banho, deve mesmo estar a sair. E a Luísa não estava contigo?! Estas todo molhado! Que se passou?! – Teresa parecia totalmente confusa com a situação, estava a passar-se alguma coisa que a sua mente perversa ainda não tinha compreendido.

- Não sei da Luísa, deve de estar para lá… precisava mesmo de refrescar a cabeça, estava a ficar degradante!

- Da cabeça aos pés?! Calma rapaz, nem parece que costumas beber uns copitos de vez enquanto.

- Mas então a Laura já esteve aqui?! E esperou muito tempo por mim?!

- Nem por isso Henrique, contamos o porquê de não estares aqui e ela decidiu esperar por ti aqui! Mas afinal o que se passa aqui!? – Teresa estava a perder o fio á miada, olhava incrédula para Henrique e passava os olhos para a mesa, onde Diogo e Tiago escutavam a conversa também com um pouco de surpresa estampada nos rostos.

- Ela nunca mais vem… tens a certeza que foi à casa de banho!? Não se passa nada, só estou um pouco ansioso!

 - Ansioso?! A Laura só foi à casa de banho, e tu tas ansioso?! E a Luísa que nunca mais aparece. Deixaste-a sozinha?!

Até que então, alguém se levanta e usa um tom de voz forte e decidido:

- Mas onde se meteu afinal a Laura e a Luísa?! Vou procurar a Luísa, e tu Henrique em vez de fazeres tantas perguntas, nada como ires bater à porta do WC feminino – Interveio indignado Tiago, a começar a achar estranho também toda aquela situação, o seu amigo apareceu sem qualquer vestígio de Luísa, mas pelo menos bem mais lúcido, completamente encharcado de água salgada e com uma cara de puto quando faz borrada! Ligeiro e decidido saiu em direcção á praia em busca de Luísa.

Ficaram todos pávidos a olhar para Henrique, que permanecia no mesmo local, em pé e com a mesma cara de assustado. Algo estava de facto a passar-se ali e ninguém estava a conseguir perceber. Perante a situação, Diogo pergunta a Henrique se ele estava a sentir-se bem e senão seria melhor sentar-se enquanto que ele chamaria por Laura. Henrique respondeu negativamente com a cabeça, e foi caminhando lentamente em direcção aos fundos do Bar. A música ecoava nos ouvidos de Henrique e proferia sons estranhos para o seu cérebro. Henrique estava desnorteado e com receio de bater à porta e ninguém responder, já não estava em nenhum bar, estava num túnel escuro sem qualquer saída… a menos, que alguém respondesse á porta! Foi então que chegou enfim à porta daquele complexo feminino, tentou aprumar-se um pouco. Dera um mergulho no mar, quando acordou e vira o que tinha feito. Queria lavar-se daquela sujidade.

Bateu bem leve na porta e uma voz feminina sussurrou umas palavras que não se ouviram minimamente, pois parecia que vinham de dentro de uma caixa de madeira. O seu coração ficou em pulgas. Estaria Laura ali, e não tivesse visto o espectáculo medonho!? Teria ela nunca dali saído e ele estava apenas a endoidecer com o sentimento de culpa?! A sua dama estaria de facto ali…?! As suas emoções estavam a mil, e a porta começou então por fim a abrir-se, por detrás saiu uma natural e descontraída figura feminina, mas a de Luísa. Especado e completamente perdido, Henrique entrou quase em choque. Mas que desilusão! Laura não estava ali, Laura havia ido embora, e porquê?! Porquê?! Teria ela visto!? Será?! Não podia ser… Henrique recusava-se a acreditar. Mas quando olhou novamente em frente era sim, Luísa que o olhava com medo. E sem nada dizer, Luísa desapareceu pelo corredor, com a gola da blusa a esconder-lhe a face direita e a sua mala tombando para todos os lados com a pressa de movimentos, como que tentando esconder a vergonha e a situação que causara, não só para os outros mas para si própria também.

(…)

….


- Porquê Laura?! Se eu te amo mais do que tudo, porquê!? Se te quero e desejo mais do que tudo porquê?! Eu não queria nada disto… Tu não merecias nada disto, eu sei! Mas perdoa-me! Perdoa-me… porque o coração não sente o que o corpo faz, e o meu coração só te sente a ti!


Um choro miudinho, desenlaçou as palavras mais duras que Henrique poderia ter ouvido:

- Porque te adoro demais, e foste e tens sido a minha vida e vivo para ti, mas… mas quando um coração parte, e se estilhaça em mil pedacinhos, jamais ficará como anteriormente, jamais os meus olhos olhariam para ti da mesma forma, já mais eu confiaria em ti… jamais o meu coração bateria da mesma forma, não mais a minha saliva secaria com o frenesim de te amar… magoas-te me! Como que alguém fica paralítico para sempre… não me procures mais! Nunca mais!

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Conheci-te naquela noite e fiquei à espera que me surpreendesses de alguma forma. Queria conversar sobre coisas impossíveis e ridículas. Não queria saber do tempo. Nem do que tu ou eu fazíamos. Ou não fazíamos. Falas-te me de croissants, e eu contei-te uma história ridícula. Falei-te de vestidos aos folhos e tu contaste-me uma história aparvalhada. Conversa de café. Conversa de almoço. Conversa de pub. Eras um rapaz estranho ao qual nada me cativou. Cara redonda repleta de barba. Cabelo todo desconcertado, super nervoso, inquieto e curioso demais. Alto e magro. De cara redonda e ideias idiotas. Não conseguia perceber de que região eras. O teu britânico, cheirava a Londres, mas com alguma rebeldia de Manchester. Não perguntei nada sobre ti, não te podia dar esse prazer de interesse aparente. Mas estava ali quieta à espera do autocarro e tu perguntaste me para onde ia o autocarro, após a minha resposta tu disseste:

"hum.. Ok, pode ser!"

Viras-te as costas, e lá continuas-te a comer uma mistela de coisas estranhas que trazias na mão. Não pude evitar um sorriso. Olhas te novamente para trás e fixas um olhar curioso em mim. Ofereceste me a mistela, que nem um miúdo de cinco anos quando tenta abordar uma miúda, oferecendo lhe o lanche. Era como dar quase a própria vida. Disseste que tu mesmo o havias cozinhado. Sabia a laranja dizias tu, apesar de me parecer uma sande de peixe. Tinhas uma guitarra às costas e um olhar tímido, que fugia do meu olhar a toda força. Que personagem curiosa, pensava eu. Disse-te que poderias ser um terrorista, ou um burlão, e não podia falar contigo. Nem muito menos partilhar o lanche. Por isso, entrei logo no primeiro autocarro que parou, e que nada tinha a haver com o meu destino. Tu prontamente retaliaste:

"Nunca confies em estranhos!! Hum... Mudança de rota... Ok. Pode ser!"

- Pedro!
- Laura!
- Local de saída?!
- Incógnito.
- Hum. Medo de estranhos?
- Medo de mim!?
- Eu não, e tu?
- Por vezes.
- Hum.. Danças?!
- Agora?!

Ele prontamente toca na campainha, e agarrou-me a mão. Enfiou o resto do lanche no lixo e saímos em New Oxford Street... Lá estava o Salsa. O pub mais latino da região. Nem queria acreditar que um estranho acabava de me colocar no autocarro errado, no tempo errado, para sair na paragem errada, para dançar salsa! Entramos e as nossas mãos dançaram ao som das batidas latinas, acompanhando o balanço da anca e dos nossos passos. Não falamos. Não me perguntas-te nada. O silêncio não te aterrorizava. Sorrias e parecias um miúdo de quinze anos. Fazias-me rodar. Fazias-me rir com o teu empenho. Rodopiávamos tanto que só conseguia ver nitidamente o teu rosto. Todo o resto era um jogo de cores e rostos distorcidos. Nem sei se existiam lá pessoas. A decoração sei que era verde. E vermelha. Azul. Amarela. Roxa. Tu não tinhas camisa às cores. Tinhas a barba grande, a cara redonda e uma camisa cinza dobro do teu tamanho. E passamos a noite a trocar as mãos. Bebemos umas "caipirinhas" da cultura latina. E trocamos mãos. Passos. Suor. Cantos. Mãos. Bailamos a sensualidade toda a noite. Sentimos o desejo primitivo.

Sem pensar, desaparecemos dali da mesma forma que entramos. Lá fora parecia ouvir o mar. Parecia ouvir as guitarras japonesas, esticando as cordas de tal forma, que o som provinha maioritariamente do toque da corda contra a madeira do instrumento, do que propriamente o seu vibrato. E eu queria puxar essas cordas e deixa-las chocar violentamente. Ouvindo o mar. Sentido o teu conforto. Passamos o Homem de Ferro a correr. Sorrias. Gritas-te ao Homem de Ferro. Imitavas tudo o que vias. Lá estavas tu. De indicador para o ar que nem o Homem de Ferro. Chegas-te perto. Os teus olhos avelã agora estavam bem atentos. Não queria interessar-me por ti. Tu tinhas medo de mim igualmente. Escondias as palmas das tuas mãos de mim, como se me escondesses a verdade. Mas os teus ombros sempre estavam na minha direcção! Mas eu tinha medo de uma pessoa tão interessante e incomum. Pedro. O autocarro parou mesmo atrás de mim.

- Não venhas.

Ficas-te parado. Como um miúdo a quem se tira o chupa. Não te conhecia. Mas eras respeitável. De ombros descaídos e os braços baixos, as tuas reacções para mim eram uma surpresa constante, agradáveis ou não, parecias sempre ser genuíno! Mas não vieste. Não acenaste. Não piscaste os olhos. Respiravas com vontade, o teu peito suspirava de tensão. Endireitas-te o saco da guitarra às costas, colocas-te um gorro velho que praticamente só deixava a barba de fora, acendes-te um cigarro, e expiras-te com vontade. Muito calmamente de sorriso meigo, começas-te a acompanhar a direcção do meu autocarro. Foi quando consegui perceber nos teus lábios as palavras...

"Fico à espera."

E ficaste estacado no chão, a ver o autocarro a contornar a esquina. Quieto e sereno. Não sei se estaria à espera de um outro género de reacção da tua parte. Mas eras um estranho muito estranho. Agarrei-me aos livros com força, e poisei o queixo neles, fitando o chão pensativa. Estava sentada no ultimo banco enquanto me deixava ir sei lá eu para onde. Meu medo só me dizia para eu ir. Fugir. Desaparecer. Porque causavas-me arrepios e fazias as minhas mãos tremerem. E eu não sei quem tu eras. Naquele dia, levava um sorriso comigo. Levava o teu. E de repente os chavalos no autocarro começaram a cantar um hip hop sereno, com bits e sons vocais. What a day! What a day!