Eu sou o Alex
e tu és a minha maior inexistência. Minha morta-viva. Morta e viva, porque estás
morta e queres possuir uma vida. És um fantasma frustrado. Morta e pálida. Eu
sou o Alex e tu és a Morta e Viva. Morta, porque em ti nunca nada existiu. Viva
porque sugas o que vês, na ânsia de possuir uma vida cheia de existência. Tu não
sentes. Copias. Tu não idolatras, tu vulgarizas. Eu sou o Alex e tu foste a
minha maior morte. Morreste-me aos pés. Pensei eu. Pois vida já não existia em
ti, a não ser o que te dei, e que te retirei com a mesma brusquidão. Mortos
vivos são aquelas coisas que querem ter vidas extraterrestres. Algo que nunca
ser-lhe-á possível obter. Tentas inventar uma vida modelo, com as mentiras pálidas
e vazias. Mentes quando dizes que o nevoeiro é reconfortante. Não tens
sensibilidade para isso. Estás morta e não viva. As flores que te dei perecem
fulminantemente nas palmas da tua mão, como carvão que se desfaz em cinza. Tu sacodes
batendo palmas altas, e sorris porque alguém te deu uma flor modelo. Para a tua
vida modelo. Para sentires as emoções
modelos que és incapaz de algum dia vir a sentir. Tu sugas as vidas padrão
daqueles que invejas, e copias-lhes as emoções. Como uma cobarde. Como um
fantasma assombrado que não sabe que morreu noutro século. A tua alma nasceu
morta de sensibilidade. A tua casa tem vinte e três janelas das vidas dos
outros. Fazendo-te vaguear pelos corredores infinitamente. De janela em janela,
tu desejas algo que és incapaz de sentir. Devoras um sonho fictício coberto de
mentiras brancas. Em cada janela há conjuntos de cores e tons. Ora vermelho e
amarelo dos parques outonais, ou o azul e branco das praias no Inverno. Verdes
e amarelos dos prados que envolvem as vidas das pessoas rurais. Os cinzentos e
pretos da vida moderna dos citadinos. Por onde passas… Colocas a cabeça pela
janela, e sugas. Sugas. Assombras e invejas tudo que não tens. Roubas as cores,
a vida. A originalidade. Engoles com a tua boca fantasmagórica todos os sonhos
daqueles que se amam e cospes todas as histórias no lixo. Guardando para ti uma
casa de sonho e umas férias paradisíacas. Nas janelas brancas e castanhas do
Alentejo sugas a comodismo, e a prancha dos surfistas, mesmo que não saibas
surfar. Todo o resto vai para a lixeira. Os meninos feios e os velhinhos
cansados vão para o lixo. Vais a Paris, e no meio dos tons amarelos e beges dos
lampiões enfiados no breu da noite, vês o acordeão mais romântico, de um
artista de rua que ia tocando um clássico de Yann Tiersen para um casal silenciado
pelo som, pelos queijos e pelo vinho francês. Atropelas tudo e levas o acordeão
para a cave. Gargalhadas altas e roupa plebeia. Fazes uma festa cheia de
mulheres sem rosto e de ancas largas que dançam a mesma batida horas a fio atrás
do álcool e droga. O cheiro a sexo adensasse e não pensas noutra coisa toda a
madrugada. Acordas no meio da merda e sorris.