segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Alex e a Morta-Viva



Eu sou o Alex e tu és a minha maior inexistência. Minha morta-viva. Morta e viva, porque estás morta e queres possuir uma vida. És um fantasma frustrado. Morta e pálida. Eu sou o Alex e tu és a Morta e Viva. Morta, porque em ti nunca nada existiu. Viva porque sugas o que vês, na ânsia de possuir uma vida cheia de existência. Tu não sentes. Copias. Tu não idolatras, tu vulgarizas. Eu sou o Alex e tu foste a minha maior morte. Morreste-me aos pés. Pensei eu. Pois vida já não existia em ti, a não ser o que te dei, e que te retirei com a mesma brusquidão. Mortos vivos são aquelas coisas que querem ter vidas extraterrestres. Algo que nunca ser-lhe-á possível obter. Tentas inventar uma vida modelo, com as mentiras pálidas e vazias. Mentes quando dizes que o nevoeiro é reconfortante. Não tens sensibilidade para isso. Estás morta e não viva. As flores que te dei perecem fulminantemente nas palmas da tua mão, como carvão que se desfaz em cinza. Tu sacodes batendo palmas altas, e sorris porque alguém te deu uma flor modelo. Para a tua vida modelo.  Para sentires as emoções modelos que és incapaz de algum dia vir a sentir. Tu sugas as vidas padrão daqueles que invejas, e copias-lhes as emoções. Como uma cobarde. Como um fantasma assombrado que não sabe que morreu noutro século. A tua alma nasceu morta de sensibilidade. A tua casa tem vinte e três janelas das vidas dos outros. Fazendo-te vaguear pelos corredores infinitamente. De janela em janela, tu desejas algo que és incapaz de sentir. Devoras um sonho fictício coberto de mentiras brancas. Em cada janela há conjuntos de cores e tons. Ora vermelho e amarelo dos parques outonais, ou o azul e branco das praias no Inverno. Verdes e amarelos dos prados que envolvem as vidas das pessoas rurais. Os cinzentos e pretos da vida moderna dos citadinos. Por onde passas… Colocas a cabeça pela janela, e sugas. Sugas. Assombras e invejas tudo que não tens. Roubas as cores, a vida. A originalidade. Engoles com a tua boca fantasmagórica todos os sonhos daqueles que se amam e cospes todas as histórias no lixo. Guardando para ti uma casa de sonho e umas férias paradisíacas. Nas janelas brancas e castanhas do Alentejo sugas a comodismo, e a prancha dos surfistas, mesmo que não saibas surfar. Todo o resto vai para a lixeira. Os meninos feios e os velhinhos cansados vão para o lixo. Vais a Paris, e no meio dos tons amarelos e beges dos lampiões enfiados no breu da noite, vês o acordeão mais romântico, de um artista de rua que ia tocando um clássico de Yann Tiersen para um casal silenciado pelo som, pelos queijos e pelo vinho francês. Atropelas tudo e levas o acordeão para a cave. Gargalhadas altas e roupa plebeia. Fazes uma festa cheia de mulheres sem rosto e de ancas largas que dançam a mesma batida horas a fio atrás do álcool e droga. O cheiro a sexo adensasse e não pensas noutra coisa toda a madrugada. Acordas no meio da merda e sorris.