segunda-feira, 11 de abril de 2011

"Cheguei a Londres na semana passada e já estou de partida. Sei que por ventura a culpa será toda dele. Dele não é. Mas eu sei que se aquela miúda nunca tivesse vindo com ele… Não lhe posso dizer isso. Mas cada qual se afecta á sua maneira. Mas está na hora de voltar a Portugal. Quero sentir o cheiro da terra batida do Alentejo. As noites geladas e os dias quentes. Quero beber os meus bagaços uma vez mais com a malta da tasca de lá de baixo. Dar de comer ao meu cão. E apanhar umas ondas daquelas que vemos o Sol tentar atravessar o azul corpo dela. A outra miúda morreu. Não há nada a fazer. O impacto do resultado daquele documentário que outrora se encontrava em produção, foi catastrófico. Como se já ninguém tivesse mais boas ideias. Como se as boas ideias já não existissem mais. E quando uma aparece… Zau. Vamos roubar! Nós compramos. Nós patrocinamos uma parte. Eu patrocino a outra. Aquele outro quer produzir. O outro assegurar! As editoras não têm mãos a medir. E é uma batalha campal entre agentes. E o Pedro, com o resto do guião fechado. Ali. Na parede ao lado. Fechado. Calado. Como se quisesse desaparecer e não conseguisse. Ele teve uma boa ideia de facto. Hum, mas não deixo de acreditar que melhor ideia, é mesmo não se ter boas ideias. Pelo menos nos dias de hoje fica tudo contaminado à nascença. As ideias são exploradas até não restar mais nada de interessante nelas. E tornam-se sobre valorizações. Coisas fúteis. Ideias sobre exploradas! Guardá-las é preferível. Talvez, pós-morte se libertem a preceito, melhor será deixar o vento leva-las. Sem alterações. Porque autor morto, conto fechado! Quem souber soube. Mas ninguém rouba a mortos! E a ideia permanece intacta. Sem alterações. Ou continuações. Ou abreviações, ou deteriorações. Eu não posso nem vou tentar fazer mais nada. Sei como é. O que é, é o que é! O Pedro parece ter-se esquecido desse conceito. Ele e a sua ideia. Não a vai largar nunca agora. A morte dela veio como que de uma flecha. Queriam mesmo dar cabo dele. Matar-lhe o conto. Roubar o materialismo a um zombie. Uma pessoa sem alma e com ideias. Foderam-no bem fodido. Essa é que é essa. E eu vou-me pôr a andar para Porto covo e deixar-me desta merdas das divagações. Pelo menos vou com a missão de levar o manuscrito original. Que me separa de culpas de deixar o Pedro sempre sozinho. O guião que todos leram. Das ideias únicas. Pura genialidade."

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